Wilson Figueiredo, jornalista da FSB Comunicações, é entrevistado por emissora de TV italiana

1 de outubro de 2010

O Brasil nas urnas: “A incógnita Dilma”

A voz da Imprensa local

Para conhecer melhor a realidade do voto, Televideo convidou duas prestigiadas personalidades da Imprensa local: Wilson Figueiredo, decano do jornalismo brasileiro, que desde os anos 60 escreve para o Jornal do Brasil do Rio de Janeiro, e Eliana Cantanhede, editorialista da Folha de São Paulo.

Como avalia o balanço dos oito anos da presidência de Lula ?

Cantanhede: Lula teve a sorte de ter sucedido Cardoso, que estabilizou a economia, reforçou as instituições e reorganizou o País. Nos oito anos de seu duplo mandato, Lula soube montar tais conquistas, mantendo a mesma política econômica, desfrutando a conjuntura internacional, extremamente favorável para o Brasil, e conduzindo um processo de inclusão social importante e significativo. Sob o plano ético, no entanto, Lula foi uma surpresa: não obstante uma popularidade de 80% não quis romper com os elementos corruptos da classe política e conduzir uma verdadeira e própria campanha moral, certamente. A nível externo, o Brasil sem dúvida ganhou muito, embora Lula tenha se aproximado talvez  mais do que devia de líderes como o venezuelano Hugo Chavez, o cubano Fidel Castro e o irariano Mahmud Ahmazdinejad.

Figueiredo: As pesquisas mostram que 80% dos brasileiros aprovam o governo de Lula, mas os restantes 20% consideram relativo o resultado real. A maneira de avaliar é subjetiva e os números não representam mais do que um modo pessoal de avaliar os efeitos de uma propaganda voltada a atordoar o cidadão. A sensação de viver em perene campanha eleitoral se iniciou no primeiro mandato de Lula, mas explodiu definitivamente durante o segundo. Ficou implícita alguma coisa, ainda indefinida, que não tem nada a ver com a democracia.

O Brasil pode se considerar hoje uma democracia madura ?

Cantanhede: Existe uma divisão entre o progresso econômico e os atrasos na prática política. Antes de poder se definir como uma democracia madura, o Brasil deve investir sobre duas frentes: a ética na política e programas sérios de redistribuição de renda. Não se pode falar de democracia quando ampla faixa da população vive ainda como no século XIX.

Figueiredo: A democracia brasileira é uma fruta colhida ainda imatura, por isso é mais fácil que apodreça do que amadureça. Depois de oito anos do governo Lula, o Brasil ficou mais longe da alarmante desigualdade social que existia, mas não por isto mais perto de uma democracia no senso completo. Esta eleição põe em confronto duas ideias diversas de democracia, mas sem adequadas formulações políticas e programas definidos. Existe uma faixa da população que teme o pior. Mas nem tudo está perdido. A democracia brasileira é um eterno partir e começar de novo. Talvez seja o modelo que começa a se desgastar.

A campanha eleitoral debateu os temas mais quentes do País?

Cantanhede: Na prática, não houve tema de campanha eleitoral, visto a polarização entre o PT de Lula e o PSDB de Cardoso. No face a face da TV, os candidatos mostraram pouco e esconderam muito.
Figueiredo: A campanha foi uma demonstração de incoerência teimosa, embora entre o governo e a oposição não existam diferenças substanciais. A divergência nas propostas é falsa. São retalhos de improvisação para remediar o vazio de ideias e de programas. Cada um esconde o seu verdadeiro objetivo.

Dilma Roussef tem conseguido emergir com sua personalidade independente?

Figueiredo: A candidata oficial é mais um ponto de interrogação do que uma expectativa. O seu passado de guerrilheira não atrapalha nem facilita. A eleição é um pecliscito sobre Lula, porque resta ainda ver quem, entre ela e ele, exercerá o poder. A natureza humana é imprevisivel, e hoje uma densa neblina nos impede de ver o futuro com clareza.

Cantanhede: Dilma Roussef é uma incógnita: ninguém pode dizer até que ponto será independente de Lula ou quanto saberá lidar com os aliados, especialmente com o PMDB, que não tem qualquer ideologia, mas é o primeiro partido brasileiro e deseja reforçar o seu papel.

Dilma se parece mais com a Michelle Bachelet ou com a Cristina Fernandez-Kirchner ?

Cantanhede: Certamente não se parece com a Bachelet, talvez um pouco com a Cristina Kirchner, que não é uma política tradicional, vive graças à força eleitoral do marido e está sempre em luta com a imprensa. Antes de fazer comparações, é ainda preciso vê-la em operação.

Figueiredo: Dilma Roussef não se parece nem com ela mesma, tanto é invisível. Lula é onipresente e dificulta qualquer visão do futuro imediato. Dilma é um personagem efêmero: nem guerrilheira, nem democrata, nem Lula. Em alguns aspectos, parece não ter saído ainda da clandestinidade.

A entrevista pode ser encontrada na íntegra no link abaixo:

http://www.televideo.rai.it/televideo/pub/articolo.jsp?id=6861